O plano de saúde pode negar tratamento home care? Jurisprudência entende que não

Para que seja possível analisar se o plano de saúde pode ou não negar o tratamento home care, é preciso, primeiro, compreender alguns pontos: i) o que é home care; ii) como conseguir um pedido de home care; iii) a importância de submissão da prescrição ao plano de saúde; iv) o que fazer diante de uma negativa; v) o entendimento dos tribunais. 

O que é o home care?

 

A internação domiciliar (home care) é como uma continuidade ou substituição da internação hospitalar/dos serviços hospitalares, que possui o objetivo de melhorar a qualidade de vida do paciente: confere mais conforto e o retira do ambiente hospitalar, de modo que evita a exposição aos riscos de contrair infecções. 

 

Como exemplos de tais casos, possível apontar pacientes em estágios avançados de Alzheimer ou Parkinson, aquele que possui sequelas de um AVC, portar demência senil, entre outros. 

 

Como exemplos de tratamento home care, há o acompanhamento por fisioterapeuta, nutricionista, fonoaudiólogo, também terapia ocupacional, a disponibilização de medicamentos, cadeiras de rodas, sondas, aparelhos respiratórios, fraldas, suporte para oxigenioterapia e cama hospitalar.

 

Como conseguir um pedido de home care?

 

É importante compreender que cabe ao médico definir se será melhor para o paciente continuar o seu tratamento na residência ou permanecer no ambiente hospitalar. Por isso, apenas o diagnóstico não é suficiente, deve haver o pedido médico. 

 

Havendo a indicação, é necessário que seja elaborado um relatório médico bem detalhado, apresentando a justificativa da necessidade de tal tratamento e a periodicidade de cada um deles. Deve ser informado, por exemplo, quais profissionais que deverão integrar a equipe multidisciplinar e a frequência e carga horária que o serviço deverá ser prestado. 

 

Ou seja, o primeiro documento essencial é a prescrição médica, além da cobertura pelo plano de tratamento hospitalar – já que o home care é uma extensão da internação hospitalar.

 

Próximo passo: submissão da prescrição ao plano de saúde 

 

Com o pedido médico em mãos, é essencial enviá-lo para a operadora de saúde, através de um protocolo. O ideal seria o plano de saúde, de forma administrativa, conceder o tratamento, por ser um direito do paciente, porém não é o que se verifica na maioria das vezes. 

 

Com efeito, os convênios costumam negar a cobertura do homecare, sob a alegação de que há a previsão de exclusão no contrato. Contudo, tal negativa vem sendo considerada abusiva pela jurisprudência, em conformidade com o Código de Defesa do Consumidor, sendo possível o questionamento de forma judicial, portanto. 

 

Como a justiça vem decidindo sobre o assunto 

 

A seguir, estão algumas decisões sobre o assunto. Em primeiro lugar, destaca-se decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que reconheceu a abusividade de cláusula e ainda a necessidade de indenização por danos morais:

 

AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. PLANO DE SAÚDE. HOME CARE. NEGATIVA DE COBERTURA. RECUSA INJUSTIFICADA. DANO MORAL. RECONHECIMENTO. ANS. ROL EXEMPLIFICATIVO. 1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 2. A orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça firmou-se no sentido de que o plano de saúde pode estabelecer as doenças que terão cobertura, mas não o tratamento, sendo abusiva a cláusula contratual que exclui tratamento domiciliar quando essencial para garantir a saúde ou a vida do segurado, como na hipótese. 3. A Terceira Turma desta Corte Superior reafirmou a jurisprudência no sentido do caráter meramente exemplificativo do rol de procedimentos da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), reputando abusiva a negativa da cobertura, pelo plano de saúde, do tratamento considerado apropriado para resguardar a saúde e a vida do paciente. 4. Agravo interno não provido.

(STJ – AgInt no REsp: 1951102 MG 2021/0233881-8, Data de Julgamento: 23/05/2022, T3 – TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 26/05/2022)

 

No mesmo sentido, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais entendeu que a cláusula é abusiva e que a recusa indevida também é causa de danos morais:

 

EMENTA: APELAÇÕES CÍVEIS – AÇÃO ORDINÁRIA HOME CARE C/C INDENIZAÇÃO – PLANO DE SAÚDE – RELAÇÃO DE CONSUMO CARACTERIZADA – APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR – INTERNAÇÃO DOMICILIAR (“HOME CARE”) – PRESCRIÇÃO MÉDICA – NEGATIVA DA OPERADORA – ABUSIVIDADE – DANO MORAL – OCORRÊNCIA – O Código de Defesa do Consumidor aplica-se às relações jurídicas entre a operadora de planos de saúde e os seus usuários – É abusiva a redução e (ou) supressão dos tratamentos prescritos ao segurado de plano de saúde em internação domiciliar (“home care”), especialmente quando houver risco à estabilidade de seu estado de saúde obtido com tratamento dispensado por equipe multidisciplinar formada por profissionais da área de saúde com distintas especialidades – A recusa indevida de cobertura de plano de saúde é causa suficiente de danos morais. (TJ-MG – AC: 10687130040573002 Timóteo, Relator: Evandro Lopes da Costa Teixeira, Data de Julgamento: 16/02/2022, Câmaras Cíveis / 17ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 18/02/2022)

 

Já o Tribunal de Justiça de São Paulo possui inclusive súmula sobre o assunto, as de nº 90 e 102, que determinam, respectivamente: 

 

Havendo expressa indicação médica para a utilização dos serviços de ‘home care’, revela-se abusiva a cláusula de exclusão inserida na avença, que não pode prevalecer

 

 

Havendo expressa indicação médica, é abusiva a negativa de cobertura de custeio de tratamento sob o argumento da sua natureza experimental ou por não estar previsto no rol de procedimentos da ANS.

 

É em tal sentido que o TJSP vem decidindo, conforme seguinte decisão:

 

APELAÇÃO CÍVEL. PLANO DE SAÚDE. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. HOME CARE. Insurgência deduzida contra sentença que impôs o custeio dos serviços prescritos para tratamento de AVC, via home care. Alegação de não cobertura do atendimento domiciliar, por ausência de obrigatoriedade legal e contratual, em razão de não constar o procedimento do rol da ANS. Impossibilidade. Recomendação prescrita indispensável ao tratamento e cuidados especiais necessários para o quadro clínico. Abusividade configurada na recusa ao fornecimento do tratamento. Precedentes desta Corte. Súmulas nºs 90 e 102 deste E. Tribunal de Justiça. Sentença mantida. RECURSO NÃO PROVIDO. (TJ-SP – AC: 10230823920208260100 SP 1023082-39.2020.8.26.0100, Relator: Márcio Boscaro, Data de Julgamento: 29/04/2022, 10ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 29/04/2022)

 

Apesar do claro entendimento jurisprudencial, infelizmente, os planos de saúde diversas vezes se recusam a fornecer um tratamento tão digno e positivo para os pacientes. Por isso, caso se encontre diante de uma negativa abusiva como essa, é aconselhado buscar orientação jurídica para garantir os seus direitos.