É comum que servidores públicos recém-empossados tenham dúvidas sobre seus direitos durante o estágio probatório — especialmente quando enfrentam problemas de saúde que exigem afastamento. Muitos temem que a licença médica possa comprometer sua permanência no cargo, levando à reprovação por falta de assiduidade. No entanto, o afastamento para tratamento de saúde é um direito garantido e não pode ser usado contra o servidor nesse período.

O estágio probatório é o período de avaliação do servidor público nomeado para cargo efetivo, durante o qual são verificados os requisitos de assiduidade, disciplina, capacidade de iniciativa, produtividade e responsabilidade. 

Ocorre que, durante esse período – que, para os servidores federais, tem duração de três anos –, não é raro que o trabalhador precise se ausentar do serviço por motivos de saúde, o que pode gerar preocupações.

Inicialmente, vale dizer que a licença médica não suspende o estágio probatório. Isso significa que não pode ser imposto ao servidor qualquer tipo de compensação pelo tempo de afastamento, que continua sendo contabilizado dentro do estágio probatório:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. ESTÁGIO PROBATÓRIO. LICENÇA PARA TRATAMENTO DE SAÚDE . PRAZO. SUSPENSÃO. PREVISÃO LEGAL. AUSÊNCIA . 1. De acordo com a jurisprudência desta Corte Superior, “inexiste, portanto, previsão legal no sentido de autorizar a suspensão da contagem do prazo de estágio probatório durante as licenças médicas gozadas pelo próprio servidor público” (RESP 2.049.016/RN, Rel . Min. REGINA HELENA COSTA, DJe 08/02/2023). 2. A conformidade do acórdão recorrido com a jurisprudência desta Corte Superior enseja a aplicação do óbice de conhecimento estampado na Súmula 83 do STJ . 3. Agravo interno desprovido. (STJ – AgInt no REsp: 2107241 RN 2023/0398563-2, Relator.: Ministro GURGEL DE FARIA, Data de Julgamento: 20/05/2024, T1 – PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 27/05/2024)

Inclusive, esse mesmo entendimento também é aplicado para a licença maternidade:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. SERVIDOR PÚBLICO. SUSPENSÃO DO ESTÁGIO PROBATÓRIO. CONTAGEM DO TEMPO . LICENÇA MATERNIDADE. LICENÇA SAÚDE. Durante o período de estágio probatório a Administração não pode computar o período de licença maternidade e licença saúde para fins de suspensão do estágio probatório. O estágio probatório somente ficará suspenso durante as licenças e os afastamentos previstos nos arts . 83, 84, § 1o, 86 e 96 da Lei nº 8.212/90. A Lei 8212/90 estabeleceu rol taxativo das hipóteses de licenças e afastamento em que o estágio probatório deve ficar suspenso, não incluindo nesse rol a licença maternidade nem a licença saúde. (TRF-4 – AG: 50165492620154040000 5016549-26 .2015.4.04.0000, Relator.: CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR, Data de Julgamento: 08/07/2015, QUARTA TURMA)

Além disso, entre os critérios avaliados, a assiduidade costuma gerar dúvidas quando o servidor necessita se afastar. A preocupação é legítima, mas é importante deixar claro: a licença para tratamento de saúde é um direito do servidor e não pode ser usada como fundamento para reprovação no estágio probatório.

Isso porque o afastamento por licença médica não configura falta injustificada ou desídia, e não prejudica a avaliação, desde que o servidor cumpra os demais requisitos de forma satisfatória. Qualquer tentativa de reprovação fundamentada exclusivamente em ausências devidamente justificadas por laudo e perícia médica viola os princípios da legalidade, razoabilidade e proteção à saúde do servidor, podendo ser questionada judicialmente, conforme decidido no seguinte caso:

REEXAME NECESSÁRIO. SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL DO MAGISTÉRIO. SÃO JOSÉ DOS CAMPOS. AÇÃO ANULATÓRIA DE ATO ADMINISTRATIVO . EXONERAÇÃO. ESTÁGIO PROBATÓRIO. REPROVAÇÃO EM AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO POR INASSIDUIDADE. SERVIDORA QUE RETIROU SUCESSIVAS LICENÇAS PARA TRATAMENTO DE SAÚDE . GRAVIDEZ DE RISCO. PRETENSÃO DE REINTEGRAÇÃO AOS QUADROS DO MAGISTÉRIO E PRORROGAÇÃO DO ESTÁGIO PROBATÓRIO. POSSIBILIDADE. OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE, RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE . SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. ART. 252 RITJSP. REEXAME NECESSÁRIO DESPROVIDO . 1. Ação de ação de obrigação de fazer, cumulada com pedido liminar proposta por ex-professora municipal, em face do Município de São José dos Campos. Pretensão julgada parcialmente procedente para determinar a anulação do ato de exoneração e, por consequência, a imediata reintegração da autora ao cargo, com prorrogação do estágio probatório, de modo a permitir nova avaliação de desempenho. 2 . Pretensão de declaração de inconstitucionalidade afastada por inadequação da via eleita Pedido de declaração de inconstitucionalidade deduzida em pretensão preliminar que não comporta amparo, diante da ausência de legitimidade ativa da requerente e de competência do MM. Juízo a quo para proceder ao exame de inconstitucionalidade de Lei municipal. 3. Ato administrativo de reprovação da autora em estágio probatório por inassiduidade que não prevalece . Ausências justificadas por prescrições médicas. Requerente acometida por crises de pânico, crises de ansiedade aguda e insônia durante o período gestacional, a caracterizar gravidez de risco. Impossibilidade de avaliar o autor durante sua ausência. 4 . Ilegalidade da decisão tomada pelo Município, que se pautou, exclusivamente, pela superação do número máximo de ausências estabelecido na legislação municipal para tratamento de saúde. Licença saúde concedida pelo próprio ente público que reconheceu a existência de fundamentos para afastamento da servidora não deve ser computado negativamente como resultado de desempenho ficto. 5. Inteligência do art . 41 da CF que condiciona a estabilidade ao efetivo exercício pelo período de três anos, a partir da prática concreta de atribuições do cargo no período, dentre as quais não se compreende o exercício ficto atinente aos períodos de afastamentos. Prazo que deve ser prorrogado pelo mesmo período de licença, de modo a permitir a avaliação em estágio probatório. Precedentes do C. STJ, deste E . Tribunal de Justiça Bandeirante e desta C. Câmara de Direito Público. 6. Requisitos de validade passíveis de controle judicial . Mérito do ato administrativo que deve ser analisado pelo Poder Judiciário sob o prisma da legalidade e dos princípios da motivação, razoabilidade e proporcionalidade. Sentença de parcial procedência da ação mantida. Reexame necessário desprovido. (TJ-SP – Remessa Necessária Cível: 1024873-62 .2023.8.26.0577 São José dos Campos, Relator.: Martin Vargas, Data de Julgamento: 26/04/2024, 10ª Câmara de Direito Público, Data de Publicação: 26/04/2024)

O servidor público em estágio probatório tem o direito de cuidar da própria saúde sem que isso lhe custe a carreira. Em caso de indeferimentos ou reprovações abusivas, não deixe de buscar amparo jurídico de quem é especialista no assunto.